Nos últimos anos já tive a oportunidade de responder essa pergunta pelo menos mais de duzentas vezes, tanto ao atender empreendedores quando ao atender mentoradas e mentorados de todo o Brasil que pensam em montar seus próprios negócios.
Muita gente poderia pensar que a empresa nasce com a abertura do CNPJ, mas existem alguns passos bastante importantes antes disso. Eu sempre costumo sugerir que a pessoa consiga estabelecer de forma clara o que gostaria de alcançar com a sua atividade econômica pois, como empreendedora e advogada que advoga para empresas, pude vivenciar que os problemas advêm quase sempre de expectativas desencontradas com o que aquela atividade específica pode trazer de retorno.
É comum que a gente faça nosso planejamento econômico de forma invertida: buscamos conhecimento técnico em alguma área, depois experiência nessa área, para daí traçar um plano de progressão, quando na verdade seria importante partir do nosso objetivo para podermos optar por uma ou mais alternativas para nos aproximar desse objetivo.
Em um exemplo hipotético: uma pessoa no início de sua trajetória profissional quer acumular dez milhões de reais em dez anos para poder prover por sua própria aposentadoria. Caso essa pessoa conte apenas com o mercado de trabalho como alternativa para alcançar essa meta, muito provavelmente o mercado de trabalho não conseguirá prover meios para esse volume de acumulação de capital. Isso significa então que o mercado de trabalho é ruim? Não, significa que, para essa meta, será necessário conjugar mais alternativas, como por exemplo postura arrojada de investimento, negócio próprio, mais de uma atividade, ajuste de meta de acordo com a disponibilidade para trabalho e as alternativas escolhidas, e por aí vai. Responder à pergunta do objetivo com a atividade econômica permite que a gente saia de um mundo abstrato e trace uma linha com o mundo real para alcançar aquele(s) objetivo(s), que por sinal não precisam e quase nunca são apenas econômicos.
Supondo que a (ou uma das) alternativa escolhida seja o empreendedorismo, muitas pessoas se perguntam no que empreender. Existem dinâmicas para que possamos identificar oportunidades para cada caso, além de eventos e cursos muito ricos de onde saem modelos de negócios e sociedades.
Mas como assim exercício de empatia? Se a gente parar para pensar nos negócios que nos impressionaram (e que nos impressionam e nos impressionarão) nos últimos tempos, aqueles que cresceram muito, alguns deles que a gente não vive mais sem, a gente vai perceber que eles nasceram de um exercício de empatia muito bem feito. Se eu tenho um imóvel ou espaço que fica sem utilização e tem um tanto de gente que pagaria para ficar nele, por que não aumentar a minha renda? Se eu tenho um carro e vou todo dia para o trabalho sozinho, será que eu poderia ocupar os espaços no carro e receber por isso? Nós não precisamos pensar em problemas mundiais se não quisermos. Fazer um raciocínio do que falta ou poderia ser feito da melhor forma para você, seus vizinhos e amigos já pode trazer excelentes ideias.
A gente elege então um problema para resolver. Melhor ainda se for uma vontade! E aí a gente parte para um passo que a gente vai abraçar para sempre, enquanto o negócio existir: vamos lá perguntar para as outras pessoas se elas também têm aquele problema ou aquela vontade. Em outras palavras, a gente vai validar o problema/vontade, e nossa sugestão de solução.
Quando a gente vê grandes empresas como o Google falando por aí que são startups, é porque elas, as startups, ensinaram para o mundo dos negócios uma forma mais rápida, mais barata e mais assertiva de descobrir se aquela dor/problema/vontade de fato existe e se as pessoas vão gostar daquela solução.
É a utilização contínua do sistema de validação prévia que faz com que as empresas se auto-intitulem para sempre com postura de startup. E sim, o mundo dos negócios agarrou com unhas e dentes esses métodos de validação.
A gente tem alguns métodos de fazer essa validação que não custam muito dinheiro (ou não custam nada), sendo os mais usados os queridos formulários do google que são circulados por whatsapp e as entrevistas com pessoas. São ferramentas poderosíssimas, especialmente as entrevistas. É incrível o quanto se aprende com as pessoas se a gente simplesmente perguntar. Elas vão te oferecer pérolas valiosíssimas e não vão nem te pedir nada por isso!
Supondo que a ideia tenha sido validada, passamos então para a construção de um protótipo da solução que pretendemos oferecer. Isso porque a gente ainda tem uma série de hipóteses para validar antes de fazer grandes investimentos. Uma vez um mentorado, que ia abrir um negócio de refeições fitness congeladas, por ter excelentes contatos, projetou todos os seus custos de operação e queria partir para a negociação. Eu perguntei: já testou as receitas? O que o pessoal achou? E o valor? Você mesmo entregou as refeições? Quanto isso custou? Centenas de milhares de reais puderam ser poupados em contratos prematuros sem que tivesse sido desenvolvida a tese básica daquele negócio.
Com o protótipo da solução em ponto de poder ser vendido (porque está longe de estar “pronto”), a gente parte para o teste de mercado real. Nada substitui essa validação. Quando montamos um negócio, precisamos ter em mente que sempre partiremos de hipóteses: desde quem é nosso cliente até como é a nossa solução. A gente quase sempre descobre novidades interessantíssimas: clientes que não tínhamos previsto, preferências por um aspecto da solução, melhoras que a gente pode fazer na solução, e por aí vai. Aqui nasce a segunda coisa que vem para ficar enquanto o negócio existir: medição. A todo tempo a gente está medindo todos os aspectos possíveis da solução, para irmos ajustando a rota a partir dos aprendizados, mas sempre com clareza dos objetivos, de forma a ter sempre um norte e não cair na tentação de sair destrambelhado resolvendo todos as dores/vontades que a gente identifica depois que começa a ter contato real com nossos clientes.
Muito embora as startups não costumem seguir uma trilha única em sua formação, é para essa fase de entrar em contato com o mercado real que a gente precisa estar pronto no sentido de documentação. Seja para que o seu cliente saiba o que esperar da sua solução (contrato de venda ou termos e condições de uso), seja para você poder cobrar do seu cliente e principalmente para pagar imposto.
Mas ainda antes disso, ali na fase da ideia mesmo, é fundamental você saber se a solução que você criou é juridicamente possível, quais aspectos no sentido jurídico que precisam ser monitorados ou podem dar problema, quanto de imposto que deverá ser pago para você poder calcular o preço de venda, e por aí vai.
Com aconselhamento jurídico, empresa aberta e aprendizados sobre o seu protótipo, aí sim o negócio começa: primeiro produto final pronto (porque sim, você vai ajustá-lo outras vezes, especialmente com os avanços tecnológicos que temos atualmente) no mercado! Terminou o teste? Nããão, nunca! O que a gente vai ter é mais coisa para medir!
E aí eu te pergunto: você validou a sua ideia? Sabe quem tem a dor/vontade que você elegeu para resolver? Quem responder que a dor é de si mesmo vai levar um “tente outra vez”, hein!
Brincadeiras à parte, muitas vezes me perguntam se é possível validar pela primeira vez com o negócio já rodando: tem que ser. Se você tem alguma dificuldade com isso, saiba que pode procurar apoio para estruturar esse processo para saber o que validar e o que medir.
Conta para nós: quer saber mais sobre validação? E sobre os próximos estágios da evolução de uma startup?
E mais, você que validou: o que aprendeu com ela e o quanto ela importa para onde seu negócio está hoje?
Saudações empreendedoras e até a próxima!
Paula Figueiredo
(São Paulo, novembro de 2024)